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Corveta Afonso Cerqueira, o refúgio submerso

Hoje descansa na Área Protegida do Cabo Girão, sendo o “berçário” de inúmeras espécies marinhas e que conta com uma bagagem repleta de muitas histórias para contar.

A 4 de setembro de 2018, todos os caminhos levaram ao centro do concelho de Câmara de Lobos. Nesta data, a multidão aguardou ansiosamente pelo afundamento do antigo navio militar NRP Corveta Afonso Cerqueira no Parque Natural Marinho do Cabo Girão (PNMCG).

Após uma rápida sequência de explosões cuidadosamente planeadas, a embarcação submergiu até ao fundo do oceano, onde repousa a 400 metros a sul do Cabo Girão, entre os 24 metros e 32 metros de profundidade.

Após 45 anos ao serviço da Marinha Portuguesa, a antiga corveta cumpre agora a sua última missão, ao tornar-se um recife artificial nesta área protegida. Para além do potencial turístico do mergulho recreativo, o novo recife artificial tem sido crucial no que toca à recuperação dos recursos piscícolas da área, aumentando a biodiversidade e proporcionando um local de abrigo para a reprodução da vida marinha.

Os recifes artificiais são estruturas submersas colocadas no fundo do mar com a finalidade de simular algumas das funções ecológicas de um recife natural, nomeadamente a proteção, regeneração, concentração e aumento da produção de recursos marinhos vivos. A antiga corveta da Armada Portuguesa foi afundada no PNMCG, dando continuidade ao processo de implementação de recifes artificiais no mar da Madeira, através do afundamento de navios, que teve início no ano de 2016, no Porto Santo.

Antes do processo de afundamento deste navio, este local foi alvo de estudo, não só numa ótica de avaliação das condições necessárias à implementação deste recife artificial, mas também numa perspetiva de avaliar os potenciais impactos sobre o meio ambiente. A escolha do local de afundamento foi realizada de forma a garantir que a “perda” da parcela de oceano onde o recife artificial foi implantado não causaria impactos negativos nas comunidades biológicas sensíveis e/ou únicas.

Passados cinco anos, o recife artificia lNRP Corveta Afonso Cerqueira tem demonstrado que tem sido uma aposta ganha, com resultados muito positivos, tanto ao nível do turismo de mergulho recreativo, bem como ao nível do aumento das espécies marinhas.

Dados recentes de monitorização por investigadores do Instituto das Florestas e Conservação da Natureza, IP-RAM e o Observatório Oceânico da Madeira (OOM), demonstram que este recife artificial tem vindo a recriar algumas das características existentes nos recifes naturais circundantes, criando condições favoráveis ao desenvolvimento da sua própria biodiversidade e atração de espécies de zonas próximas. Embora com variações sazonais, no decorrer dos trabalhos de investigação iniciais, foram contabilizadas vinte e seis espécies distintas de ictiofauna.

No que diz respeito à prática de mergulho recreativo, o trabalho de monitorização do GIRO – Projeto de Valorização da Área Protegida do Cabo Girão tem demonstrado um crescente interesse pela atividade, desde 2019, contabilizando uma média de 97 mergulhadores por semana (época alta de 2023), comprovando-se a possibilidade de conciliação da conservação da natureza com a atividade turística.

Ao visitar o mais recente recife artificial da Região Autónoma da Madeira é possível explorar o mobiliário, equipamentos e salas originais do navio, bem como deixar-se encantar pela vida marinha que aqui habita, nomeadamente pelas manchas da alga verde Caulerpa prolifera, por uma grande diversidade de enguias-de-jardim, Heteroconger longissimus e muitas outras espécies marinhas.

A corveta Afonso Cerqueira iniciou a sua história ao serviço da Marinha Portuguesa a 28 de junho de 1975. Patrulhou Timor-Leste, durante a invasão da Indonésia, regressou a Lisboa, após uma volta ao mundo com mais de 20 mil quilómetros pelo Índico e Pacífico. Visitou as comunidades portuguesas presentes no Havai e Califórnia, atravessou o canal do Panamá e fez paragens na Austrália, Japão, e Venezuela.

Hoje descansa na Área Protegida do Cabo Girão, sendo o “berçário” de inúmeras espécies marinhas e que conta com uma bagagem repleta de muitas histórias para contar.

 

Escrito por Jéssica Teixeira para a edição de 12/09/2023 da Revista Wilder.

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Categoria:

Sala de Imprensa

Data de Publicação:

12 Set, 2023 às 12:00

(Editado: 14 Set, 2023 às 10:14)

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